Beija-flor briga?

Foto de Zdeněk Macháček na Unsplash

Briga.

Eu não sabia disso. Foi um choque descobrir que uma criaturinha tão pequena, com ares tão singelos, assim como o seu nome sugere, além de remeter ao poético e ao belo, seja tão briguenta. Só acreditei porque vi. Ao ver, duvidei e fui pesquisar.

Todo mundo, ou pelo menos a maioria das pessoas, se encanta ao ver um beija-flor, fazendo jus a seu nome. Da mesma forma acontece comigo. Em nome desse sentimento, resolvi comprar alguns bebedouros para essa espécie de pássaro e colocá-los na minha varanda. Nos primeiros dias, foi puro encantamento, mas isso não durou muito. Um dia, estava observando, da sala, esse animalzinho matando a sede. Quando ele se afastou e um colega se aproximou para também molhar o biquinho comprido, o outro logo fez carreira e o afastou com uma forte trombada. Mais uma tentativa e outra trombada ainda mais violenta. Após essa, o colega ao perceber a menção de ser novamente rechaçado, voou para longe.

O meu primeiro pensamento foi o de que se tratava de um caso isolado de um encrenqueirinho de plantão. Então, resolvi agir em defesa do beija-flor agredido, decidindo que à próxima ameaça de ataque, eu espantaria o agressor para que o bebedouro pudesse ser compartilhado. Ledo engano. Antes que eu pudesse reagir, a pobre vítima foi atacada, repentinamente, pelo briguento. Nem sei de onde ele surgiu. Concluí que estava vigiando à distância e partiu para a defesa do seu território assim que o colega pousou para beber água. Nem deu tempo de tomar um gole. Ao invés disso, tomou, literalmente, uma voadora.

Fiquei indignada com o danadinho e com a minha impossibilidade de impedir aquela injustiça do reino animal. O jeito foi aceitar, tristemente, a minha condição de espectadora de briga de gente pequena.

No dia seguinte, fui comentar com o meu filho sobre o acontecido. Assim que ouviu a minha história, logo rebateu:
- Mãe, não interfira na natureza.
Em seguida concluiu:
- Deve ser uma espécie territorialista.
Não havia pensado nisso. Eureka! Fui ao Google e logo confirmei: são territorialistas e briguentos. Caí das nuvens!

Após essas descobertas, para diminuir a discórdia entre as avezinhas bicudas, tivemos a ideia de colocar os bebedouros separados, colocando um na janela do quarto do meu filho e deixando o outro na varanda. Enorme foi a nossa surpresa, quando começamos a receber a visita de um sibito, um gracioso passarinho de um bico também fino e canto curto e agudo, porém agradável. Imaginamos que o beija-flor brigão iria botá-lo para correr, ou melhor, voar. Contudo, isso não aconteceu. Por algum motivo, ele respeita o sibito ou talvez o tema.

Fiquei tentando entender todo esse contexto. Lembrei que nós humanos fazemos muito isso: batemos nos de casa, mas tratamos bem ou respeitamos os de fora por medo, respeito ou pudor. O fato é que a doce imagem que eu nutria do beija-flor ficou abalada. Queria nunca ter conhecido essa face desse bichinho tão hábil e gracioso, que consegue bater as asas 80 vezes por segundo e de uma forma tal que paira no ar como nenhum outro pássaro. Um capricho da natureza.

No entanto, como tudo tem seu lado bom e ruim, da mesma forma que há pessoas boas com defeitos incômodos, há essas criaturinhas singelas e briguentas. Eu até acharia mais "entendível" se fosse uma atitude contra um pássaro de outra espécie, mas talvez ele seja inteligente o suficiente para saber que só consegue brigar com gente do tamanho dele. Vá saber o que a natureza reservou para essa avezinha tão inspiradora! Mas só quando não está rivalizando!

06/07/2024