Você vai ser roubado

Foto: Isaiah Rustad

Quando alguém chega para você e diz “por mais que você tenha cuidado,   você vai ser roubado”, a primeira coisa que pensamos é: “não é possível, deve haver uma maneira de evitar isso”. Então a gente se enche de   precaução e acha que vai se livrar, que com a gente vai ser diferente.

Há alguns anos resolvemos fazer uma viagem para um país da América  do Sul, sabíamos que ele não estava em seus melhores momentos, mas, ainda assim, valeria a pena conhecer e desfrutar das belezas de sua capital, um pedacinho da Europa na América. Seguimos com nossos planos de viagem e é claro com os nossos alertas ligados, nada que detivesse um brasileiro, em geral acostumado a viver atento, a não ser pelo fato de que preferimos poder baixar a guarda e relaxar quando estamos em viagem. E assim seguimos naquela aventura aparentemente sem incidentes, considerando que conseguimos driblar um quase golpe quando compramos um pacote para assistir a uma apresentação de tango e percebemos a tempo a tentativa de sermos ludibriados.

Quando terminamos de cumprir a nossa agenda naquela cidade e finalmente pegamos o táxi rumo ao aeroporto, certos de que havíamos escapado ilesos do “você vai ser roubado”, comecei a perceber que o motorista do táxi estava dando uma volta na cidade para chegar a um local o qual eu havia verificado no mapa e ficava há no máximo 10 min de onde estávamos hospedados. Resolvemos dar um desconto visto que até ali, tudo tinha ido bem. Porém, ao chegarmos ao nosso destino, fomos surpreendidos com a cobrança da nossa bagagem sem aviso, além do aumento do percurso. Tínhamos imaginado que a aplicação do golpe do trajeto tinha sido suficiente para o taxista, então quando ele nos cobrou as bagagens saímos do sério e, mesmo com toda a tentativa de intimidação, não pagamos a cobrança extra, que poderíamos até ter pago, se ele tivesse feito o caminho correto. E então passado o episódio, nos restou a constatação de que não adiantou, mesmo com todos os cuidados terminamos sendo roubados, aos 46 min do segundo tempo.

Lembrei desse caso porque outro dia ouvimos novamente a mesma advertência, só que dessa vez o cenário era bem diferente. Aconteceu quando tivemos a necessidade de comprar uma peça do nosso carro e um colega nos indicou um lugar em uma avenida onde existe uma variedade de lojas especializadas em peças de automóveis, só que ele nos advertiu: “vão encontrar a peça, com certeza, mas vocês vão ser roubados”. Não pude evitar de lembrar do nosso episódio da viagem, no entanto, decidimos que desta vez não seríamos pegos. E não fomos.

Quando moramos em um país onde consentimos fatos como esses, mesmo sabendo que eles não deveriam existir, talvez seja porque de fato, aceitamos essas discrepâncias. Acredito que é preciso combater esse tipo de coisa não concordando e questionando a atitude das pessoas que se prestam a esse comportamento. É como ser enganado em oficinas, a maioria ilude seus clientes, todos sabem disso e se deixam enganar com uma facilidade espantosa, parece que é mais fácil não brigar pelo certo, então aqui e ali vamos sendo subtraídos, uma soma que no final todos saem perdendo, mesmo aqueles que acham que estão levando vantagem. Mas o tempo faz a roda do destino girar, e não importa o quanto são grandes, temos visto verdadeiros gigantes caírem, eles entram num ciclo em que ganham aqui e perdem ali, mas o fim deles é uma questão de tempo. Acredito nisso, como quero acreditar que um dia não tenha mais que ouvir: “não adianta, vocês vão ser roubados!”.

19/12/2021