A volta dos que não foram a lugar nenhum

 

Assim como muitos que estão passando por esse inesperado tempo de pandemia, eu também tive meus momentos de reflexão sobre o sentido da vida, sobre as lições positivas, mesmo que pareça estranho e, inevitavelmente das negativas que vieram junto com essa experiência, pois dificilmente não há como ficar impassível diante de tempos tão diferentes e que nos levou a uma condição tão adversa do nosso cotidiano e daquilo que chamamos de vida moderna.

E pensando nas coisas positivas, descobri que o silêncio é bom e necessário para que possamos escutar a nós mesmos e para descansar a nossa mente. Com a reclusão as ruas ficaram mais silenciosas, assim como os lares, fazendo com que apesar do momento vivido, fosse possível sentir uma rara calma no ambiente. Mas o que tem me chocado ultimamente é ter visto e presenciado o desespero de algumas pessoas para voltarem exatamente ao que tinham antes, como festas, muito barulho e agitação, como se tudo tivesse acabado e como se essa prova vivida de nada tivesse servido, como se esse momento tão diferente não representasse nada ou não dissesse coisa alguma, ou seja, essas pessoas não foram a lugar nenhum dentro de si mesmas, e querem voltar para algo que dificilmente será igual. Não creio que seja à toa que estejamos vivendo essa experiência e tenho visto tantas pessoas falarem sobre o repensar que este momento trouxe e as oportunidades enxergadas, que não consigo evitar de me surpreender com aqueles que não fizeram outra coisa a não ser esperar pelo seu “retorno triunfante” e mais do que isso, algumas pessoas simplesmente continuaram suas vidas como se nada estivesse acontecendo, mantendo-se alheias e recusando-se a deixar de viver como se não houvesse amanhã, atitude até bastante louvável, se dentro de um outro contexto.

Mas, ainda bem que se existem aqueles que não foram a lugar nenhum, posso dizer que me orgulho de algumas pessoas que foram à luta, aproveitando as oportunidades surgidas, como por exemplo, o bom uso das redes sociais para captar negócios e mostrar o seu valor, como também aqueles que se mobilizaram para ajudar pessoas menos favorecidas e que foram drasticamente afetadas por esse momento tão difícil. Também acredito que foi um momento de transformação para muitas famílias que tiveram que conviver entre si e dividir tarefas. Quantos pais se aproximaram mais de seus filhos e quantos filhos e maridos passaram a ser mais colaborativos, vi isso acontecer muito ao meu redor e dentro da minha própria casa, isso é o que chamo de experiências positivas de um momento tão adverso.

Isso tudo me faz pensar em como o ser humano reage ou não, diante de momentos desafiadores. É claro que cada um tem sua própria percepção das coisas, mas não deixa de ser curioso que algo tão impactante para o mundo possa não fazer qualquer efeito em algumas pessoas, e que elas simplesmente ignorem ou nada tirem como lição ou, assim que tenham a oportunidade de voltar ao seu mundo anterior o façam com uma ansiedade feroz e com uma sede animal chocante. Mas, como diz um famoso filme “e assim caminha a humanidade”, o imagino onde essas pessoas irão chegar, ou até imagino que, na verdade, não irão muito longe, pelo menos para longe desse mundo em que estão submergidas e limitadas, havendo sempre enquanto houver vida, a esperança de uma mudança e de que desses seres possa brotar algo de positivo, afinal não quero crer que precisaremos de uma segunda ou terceira onda da pandemia para iluminar a mente da maioria dos habitantes do nosso planeta e principalmente dos brasileiros, tradicionalmente adormecidos, “deitados em berço esplêndido”, esperando que algo ou alguém salve a pátria de si mesma ou de uma pandemia qualquer.

                                                                                                                                                  08/12/2020