O home office que não escolhemos

Um dia de repente, você chega de viagem de férias e recebe a noticia de que vai começar a trabalhar em home office, algo para o qual não estávamos preparados e não planejamos, mas que chegou como consequência de uma situação de exceção, uma pandemia inesperada que a todos impactou. Além disso, esse trabalho em casa deverá conviver em paralelo com os trabalhos domésticos, frutos de um momento em que a ajuda externa não seria permitida, criando um cenário desafiador e ao mesmo tempo doloroso, visto que não estávamos prontos para esse novo cenário e tínhamos a nossa estrutura de vida organizada de acordo com a realidade vigente, cada um com a sua própria.

Então a coisa começa e ainda não sabemos como vai funcionar e precisaremos configurar e preparar o nosso computador de casa para acessar o ambiente da empresa em que trabalhamos, depois de ultrapassados muitos obstáculos, finalmente conseguimos iniciar as nossas tarefas laborais. Mas aí a casa nos chama e, como precisamos cumprir aquilo que a empresa espera, é necessário nos dividirmos ou mesmo nos multiplicarmos, porque se certas coisas não podem aguardar pelo intervalo do trabalho, fazemos ao mesmo tempo, porque o cotidiano de uma casa nem sempre pode esperar. Se não há, por exemplo, alguém que tome conta de um filho pequeno, como a mãe irá trabalhar? Certamente ela o colocará no colo para continuar o seu trabalho, mas isto é só uma dentre centenas de situações cotidianas a serem enfrentadas por um home office inesperado e não planejado.

Os efeitos colaterais então seriam o esperado de um contexto repentino. Desde problemas físicos, resultantes de um ambiente inadequado para o trabalho, como móveis não ergonômicos, a os psicológicos, resultantes de uma pressão por mostrar resultados, mesmo diante de um cenário tão adverso e extremamente complicado para algumas pessoas. Mas a vida é isso e, se não estávamos preparados para esse formato de trabalho, é porque talvez não estejamos acompanhando a evolução social alinhada à tecnológica. Na verdade em alguns países isso já é uma realidade, assim como em cidades desenvolvidas do nosso país. Tenho visto em programas de TV que é comum em alguns lugares, as pessoas terem escritório em casa e é claro que para as empresas representa uma grande economia e é óbvio que elas sabem disso, porém o nosso delay vem de questões bem profundas onde não cuidamos do básico, portanto, não fazendo sentido cuidar daquilo que a evolução tecnológica gera, que é o que acontece quando a gente não cresce socialmente. O resultado é sermos atropelados fatalmente por algo que já devíamos estar alinhados, mas na realidade desconhecemos ou não queremos saber, porque nem sequer combina com a nossa identidade cultural, estilo de vida e sociedade.

Mas a coisa está posta para nós e amanhã muitas empresas diante da constatação do que já supunham, começarão, e já estão começando, a fazer dessa prática uma realidade. Resta-nos tentarmos nos adaptar a esse novo contexto de vida, procurando separar a nossa vida pessoal do trabalho, o que é bem difícil, culturalmente falando. Talvez para alguns isto seja uma escolha, mas para outros não, e se hoje fala-se de um novo normal atrelado a novos comportamentos em razão da pandemia que vivemos, o home office pode-se dizer que fará parte disso possivelmente ou talvez inevitavelmente. 

03/11/2020