Assistindo a história repassar

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Apesar de saber que todo tempo vivido corresponde a uma época na história, não consigo deixar de pensar no quanto é estranho vivenciar fases tão diferentes em um período tão curto de existência, considerando que os fatos históricos parecem estar inseridos em épocas bem distintas, e quando olhamos para trás, tudo parece tão distante, como se o tempo fosse contado de forma diferente, quando o passado é muito remoto.

Imagino que soe estranho falar dessa forma, mas o que quero dizer é que, dentro dos anos que vivi, não pensei que pudesse assistir ao meu país e ao mundo sofrer mudanças que remontam a um tempo tão recente. É difícil acreditar que algo historicamente ruim possa voltar a existir dentro de um tempo de uma mesma existência. Se registramos a história para não repetir os erros e amadurecer com eles, não parece coerente reviver situações do passado das quais lutamos para nos libertar. Livros e filmes passam diante dos nossos olhos as cenas de períodos recentes da nossa história, que são o registro exato do que não queremos mais, e que nos condenou a um grande atraso em todos os níveis. É para que aprendamos, é para que não esqueçamos. Podemos dizer que “ontem” estávamos lutando por liberdades, conquista de direitos e igualdade, em vários lugares do planeta, assim como em nosso país, enquanto hoje muitos desses mesmos direitos e liberdades conquistados estão sendo perdidos, ou mesmo entregues até por quem um dia se beneficiou deles.

Mesmo sabendo que o mundo continua a girar como sempre, temos que concordar que não faz sentido pessoas que ontem se arriscavam nas ruas para brigar por direitos e dignidade do trabalhador hoje sejam surpreendidas por governos que tentam compensar suas incapacidades sacrificando os mais fracos e obrigando os já cansados a travarem lutas vencidas. Não é justo nem compreensível que liberdades de expressão conquistadas a custo de muitas vidas estejam hoje ameaçadas. Não é concebível que, por exemplo, pessoas que viveram os anos de chumbo no Brasil, e sofreram com isso ou assistiram àquele momento, agora revivam estarrecidas o temor de outrora, que parecia enterrado com o passado, o qual deveria ter ficado para trás e servido como lição para um país jovem, que ainda tem muito a conquistar e evoluir, e não pode “se dar ao luxo” de retroceder no pouco que avançou. Países que hoje estão retrocedendo politicamente, como alguns da Europa, estão muito além de nós, porque ainda somos socialmente adolescentes, para permitirmos que nos tirem o pouco que evoluímos como nação.

E é por tudo isso que ainda reluto em entender o porquê de, em tão pouco tempo, voltarmos para realidades as quais não deveríamos revisitar, a menos que de fato tenhamos que sofrer mais uma vez para aprendermos o que ali, bem atrás, o tempo tentou nos ensinar e não fomos capazes de aprender. Haja vista o abominável preconceito preconizado na Segunda Guerra Mundial, que hoje ressurge pouco a pouco em muitos países, numa demonstração clara de que o ser humano não tem aprendido com os erros, não somente aqui em nosso solo, mas mundo afora. Se há esperança? Talvez, porque, de acordo com a história, há também sempre os “heróis da resistência”, que não se deixam seduzir pela banalidade do mal, que volta e meia assola a humanidade, e continuam lutando por um mundo melhor, apesar de tudo e daqueles que não conseguem enxergar no outro um ser humano igual a ele mesmo.


08/09/2019