A casa de azulejos azuis

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 Quando a gente é criança tudo parece grande e aí quando a gente fica mais velho guarda muitas lembranças de coisas que depois descobrimos que não eram tão grandes, quanto a nossa memória nos dizia. E foi exatamente isso que aconteceu comigo em relação a uma das casas que morei na minha infância.

A vida é cheia de coincidências e um dia um amigo do meu marido foi nos visitar e no meio de uma conversa falou que morava em um lugar que identifiquei ser perto de onde eu havia morado na infância. Então numa outra ocasião em que ele nos visitou, meu marido decidiu deixá-lo em casa. Quando estávamos perto da casa dele, pensei: por que não passar pela minha antiga residência e ver como estão, a rua e a casa? Fazia quase 20 anos desde a última vez que eu havia passado por lá e achei que seria interessante rever aquela casa de azulejos azuis com branco tão presente nas minhas memórias. Mas, enorme foi a minha surpresa ao descobrir que ela era bem menor do que a casa da minha lembrança, mesmo vendo através de fotos que tínhamos daquela época não conseguia dimensionar o seu tamanho real, passou um tempo até me acostumar com aquela nova imagem, acredito que o meu cérebro ficou um pouco confuso e o subconsciente deve ter se perguntado: e não era maior? O que houve? Encolheu? E o jardim tão grande também diminuiu de tamanho? Como me senti incomodada com aquela situação, comentei na hora: “nossa! Como parece menor, estou chocada com a imagem que havia guardado”, foi um desabafo que valeu o consolo que veio da parte deles através da afirmação de que quando somos crianças, tudo parece grande.

Fiquei tão cabreira com esse acontecimento que na época liguei para a minha mãe e comentei a respeito. E fiquei “matutando” sobre aquilo, a tal ponto que comecei a lembrar de outras coisas da mesma época que me pareciam grandes, como a própria rua onde ficava a tal casa de azulejos azuis que lembrei o quanto a achava larga e no dia que a vi também percebi o quanto ela era estreita, até isso! Então lembrei do rapaz que fazia reparos na nossa casa, que na minha lembrança era super alto e comprido, e tive que tirar a dúvida com a minha mãe se aquela recordação correspondia a verdade, desta vez foi um alívio saber que de fato ele era alto e magro, talvez nem tanto quanto imagino, mas próximo do real ou não, nunca saberei.

Depois que nos mudamos da casa de azulejos azuis, fomos morar numa rua bem próxima, numa casa de azulejos cor de vinho. Então já que tinha ido matar a minha curiosidade em relação a primeira casa, resolvi olhar essa outra para desafiar novamente a minha memória, e para minha não surpresa a impressão foi a mesma, queria estar enganada! Juro que queria! Por que cargas d'água essas casas encolhem com o tempo? essa deve ter sido a pergunta da vez do meu subconsciente. O fato é que hoje tenho dúvidas se é realmente uma boa ideia desafiar nossas lembranças, talvez seja melhor deixar aquelas imagens arquivadas do jeitinho que o tempo guardou, elas podem ser mais doces e bonitas que a realidade, como se costuma dizer: deixa quieto!

E o pior da segunda casa? o azulejo vinho em alto relevo de grande beleza não existia mais, aumentando a minha indignação. Foi colocada uma cerâmica igual no muro e na casa, numa cor bem neutra, tão diferente daquele belo vinho, e o muro todo furadinho foi fechado. Basta! O que fui fazer lá? O consolo é que pelo menos elas não foram derrubadas para em seu lugar construírem prédios que lotam os bairros da cidade. Nesse bairro onde morei casas ainda são muito comuns, o que dá até uma certa nostalgia, pena que as crianças não podem curtir a rua como curtíamos, pois hoje o asfalto duro e quente não permite mais as brincadeiras de outrora e a insegurança tranca de vez cada um em sua casa, com ou sem azulejos azuis.

11/04/2021